Águia-caçadeira? Tartaranhão-caçador?
O nosso nome permite distinguir-nos entre os restantes indivíduos da sociedade, conferindo um carácter identitário em princípio único.
O nome comum da maioria das aves não costuma gerar risco de confusão ou de dúvida na generalidade dos países europeus, principalmente naqueles com maior tradição de literatura sobre a natureza, quer por meio de contos infantis quer através de publicações de grande difusão. Em Portugal, em consequência da baixa literacia da generalidade da população e da escassez de publicações sobre vida silvestre até anos muito recentes, o conhecimento do nome vernáculo de animais e plantas esteve quase sempre circunscrito à transmissão oral, podendo variar bastante entre regiões para uma mesma espécie ou atribuindo-se o mesmo nome a diversas espécies.
Ao conversar com pastores ou agricultores, verifica-se que para algumas espécies a identificação é fácil, em especial as cinegéticas ou aves como Abetarda, o Sisão ou a Cegonha-branca. Porém, para as aves de rapina subsiste ainda alguma confusão na designação das diferentes espécies ou mesmo na sua correcta identificação.
Num questionário realizado em 2005 junto de agricultores do Alentejo, pediu-se para indicarem o nome pelo qual conheciam a espécie Circus pygargus, tendo surgido vinte e oito diferentes respostas, sendo as mais frequentes: águia caçadeira, tartaranhão caçador, peneireiro, gavião, águia, águia caçadora e milhafre.
Quando, há quase 30 anos comecei a observar aves (e não existam guias de identificação em português), adoptei o nome comum Águia-caçadeira por ser aquele que era utilizado no Alentejo. Mais tarde, em comunicações e artigos passei a empregar a denominação Tartaranhão-caçador por ser a que constava na sistematização adoptada por Sacarrão & Soares (1979) Nomes Portugueses para as Aves da Europa, trabalho este de referência a nível nacional, mas também por ser tecnicamente mais correcta porque as aves do género Circus estão filogeneticamente afastadas das verdadeiras águias.
Durante o trabalho de campo para a dissertação de mestrado, iniciado em 1997, eu era conhecido como o “homem das águias” e não como o “homem dos tartaranhões” e a palavra tartaranhão é mais difícil de utilizar em vez de águia numa conversa fluente com um operador da ceifeira-debulhadora para evitar a destruição de ninhos. Assim, quase sempre no terreno servia-me do nome Águia-caçadeira.
Com a publicação de Nomes Portugueses das Aves do Paleártico Ocidental por Hélder Costa e outros em 2000, é proposta a denominação Águia-caçadeira como a mais correcta.
Nos últimos anos, ambos os nomes comuns surgem em publicações oficiais, trabalhos académicos ou relatórios de avaliação de impacte ambiental. Mas caminha-se para alguma uniformização e sou da opinião que deve prevalecer o nome pelo qual é mais reconhecida no Alentejo, onde se concentra a maioria da população reprodutora em território nacional.
Fica assim explicado o título deste blogue.